Luiz Marins
Uma grande empresa decidiu, após muitos estudos e consulta a seus funcionários, montar um gabinete dentário completo dentro da fabrica. Um dentista foi contratado e, sem qualquer cerimonia especial, num certo dia, o dentista começou a atender os operários.
Conversando com esse dentista, ele me disse que sentia uma “frieza” por parte dos funcionários. Fazia oito meses que o gabinete dentário estava funcionando. Ele mesmo tinha andado várias vezes pelas oficinas da fábrica colocando-se à disposição dos funcionários que pareciam, segundo ele, não valorizar o fato de a indústria ter colocado um gabinete dentário somente para atendê-los.
Por sua vez, a diretoria da fabrica dizia: “Não adianta fazer nada para os operários. Gastamos milhões de reais num gabinete dentário completo e os operários nem valorizaram, nem apareceram para fazer tratamento. E é tudo gratuito!”
Quando fui comunicado dessa situação, perguntei logo como foi que o gabinete dentário foi colocado na indústria. A resposta veio simples e direta. “- Reformamos a sala, adquirimos os equipamentos e contratamos o dentista e mandamos um memorando para todos os chefes e colocamos um aviso no quadro de avisos: - ‘A PARTIR DA PRÓXIMA 4ª FEIRA HAVERÁ UM DENTISTA ATENDENDO NO NOVO GABINETE DENTÁRIO. AS CONSULTAS E TRATAMENTOS SÃO GRATUITOS. FALE COM SEU SUPERVISOR A RESPEITO.’”
Confesso que foi difícil convencer os diretores da fábrica sobre qual tinha sido o erro cometido.
Imediatamente propus que fosse feita uma cerimônia de “Inauguração” do Gabinete Dentário, com a presença de todos os funcionários (num final de expediente ou troca de turma) e com as seguintes providências adicionais e absolutamente necessárias:
• Colocar uma placa como o “nome” no Gabinete. Esse nome, deveria ser escolhido pelos próprios funcionários com antecedência para que no dia da inauguração a placa já estivesse pronta e colocada;
• Cobrir a placa com um pano com as cores da empresa, para que fosse descerrada pelo presidente da empresa (que deveria comparecer no dia da inauguração), juntamente com o funcionário mais antigo, o funcionário mais novo, o dentista e o gerente da fábrica. O representante do Sindicato ou da Comissão de Fábrica, também deveria participar do descerramento da placa;
• Colocar uma fita na entrada do Gabinete Dentário para ser desatada pela operária mais antiga, pela mais nova, juntamente com o presidente da empresa;
• O presidente da empresa deveria fazer um discurso;
• Um representante dos operários deveria fazer um discurso;
• Após o descerramento da placa e desatamento da fita, todos seriam convidados a visitar o Gabinete Dentário, percorrendo suas instalações;
• Após a cerimônia (bastante formal) haveria alguma coisa para comer e beber, servido aos operários.
Os diretores da indústria disseram sentir-se envergonhados de fazer tudo aquilo. Sentiam-se como “políticos em campanha”. Expliquei que tudo aquilo era absolutamente necessário para que todos os beneficiados “incorporassem” o novo gabinete dentário.
Tudo foi feito como pedi. O sucesso foi enorme!
Nas semanas e meses que se seguiram, todos os operários comentavam o novo benefício. O Sindicato dos trabalhadores enviou uma carta à empresa elogiando a iniciativa. O dentista teve um trabalho oposto ao que sentia anteriormente: teve que organizar um horário para atendimento dos muitos operários que agora desejavam tratar de seus dentes.
Afinal, o que aconteceu?
Será que os operários não sabiam da existência do gabinete dentário antes da sua “inauguração”, que se deu oito meses depois de aberto ao atendimento?
Uma das coisas mais importantes no Brasil é “solenizar” ou “cerimonializar” os atos na empresa. Todos os atos importantes, para serem vistos como realmente importantes, precisam ser cerimonializados, solenizados. E como todo “rito” deve ter “discurso e comida ”.
Não há cerimônia em nenhuma sociedade que não tenham esses dois componentes essenciais. “Ouvindo e comendo ou bebendo” é que as pessoas realmente introjetam o fato ou acontecimento passando a incorporá-lo definitivamente. Assim são nos casamentos, batizados, aniversários, etc.
Assim, um dos mais sérios erros que as empresas podem cometer é a de simplesmente colocar para funcionar as coisas sem a devida atenção ao “como” essas coisas são colocadas para funcionar.
Demos o exemplo de um gabinete dentário que é um espaço físico, com equipamentos, etc. No entanto, essa mesma orientação vale para qualquer outra coisa. Por exemplo, a adoção de um novo uniforme, a adoção da obrigatoriedade do uso de crachás, a incorporação de novos veículos numa frota, etc. etc.
No Brasil, com o homem brasileiro, nada dever ser feito sem se estudar o “como” será introduzido na empresa, sob pena de ver-se a sua utilização minimizada, desvalorizada ou mesmo malversada. Na Europa, nos Estados Unidos, onde a sociedade não é oral e auditiva como a brasileira, essas providências não são fundamentais. Porém, o homem brasileiro é diferente e precisa ser tratado diferentemente pela empresa.
Experimente “solenizar” e “cerimonializar” algumas coisas essenciais na sua empresa daqui para frente. Você verá a diferença. Você verá que as pessoas passarão a realmente “incorporar” as mudanças ocorridas e passarão a segui-las e atendê-las mais facilmente. A comunicação de fato se estabelecerá. Os objetivos ficarão mais explicitados e a importância do fato será realmente sentida e avaliada. Tenho visto muitas empresas perderem tempo, recursos, energia, por não compreenderem essa verdade antropológica do homem brasileiro. Não cometa o mesmo erro. Experimente.
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